A VOZ DO ESTUDANTE
No final dos anos cinqüenta, até a metade dos anos sessenta, na nossa Itajaí, após terminar o curso ginasial (o correspondente hoje ao ensino fundamental) os meninos e meninas com idades de 14 ou mais anos tinham as opções. Para as meninas fazer o curso Normal no Colégio São José ou o Regional no Colégio Victor Meirelles, cursos que formavam as professoras para o curso primário, correspondente hoje as primeiras séries do ensino fundamental. Para os meninos fazer contabilidade na Escola Técnica de Comércio de Itajaí, a escola do Professor Morisco, que funcionava no período noturno anexo ao Colégio Estadual Victor Meirelles, ou migrar de sua terra para fazer o curso Cientifico que dava o conhecimento para as ciências exatas e biológicas, específicas para as carreiras de engenharia ou das áreas da saúde, ou curso Clássico voltado para as Ciências Humanas.
Lá íamos nós para Blumenau, Florianópolis, Curitiba ou até para o Rio de Janeiro.
Aqui ficavam a família, as namoradinhas, alguns amigos, que depois de formados em contabilidade aventuravam um concurso para o Banco do Brasil, o grande emprego da época, ou uma vaga no Banco INCO – Banco Indústria e Comércio de Santa Catarina. - na matiz, que ficava aqui em Itajaí. Na segunda metade dos anos sessenta o Colégio Salesiano implantou o curso cientifico. Curso Superior nem pensar só nas grandes capitais,
Porém um grupo de estudantes da nossa Itajaí, não se conformava, nem se acomodava com esta situação. Associados a UNIÂO DOS ESTUDANTES SECUNDARIOS DE ITAJAÍ, a nossa UESI, como era conhecida e merecedora de um artigo, que espero em breve poder escrever, com ajuda dos presidentes eleitos, na mais pura aula de democracia e cidadania, o Valdir João da Silva, o Dalton Melin, o diretor deste O JORNAL, Antonio Carlos Campos e Silva, o Toninho da UESI.
Nossas lutas estudantis, pelo meio ingresso do cinema, por uma biblioteca pública, por mais cursos para a cidade e por uma Universidade, Não pintávamos as caras, insuflados por meios de comunicação, não invadíamos reitorias ou órgãos públicos, nossa arma era a voz, através de um programa radiofônico, que ia ao ar na nossa Radio Difusora de Itajaí.
Tudo começava assim:
– A ZYK 9, Radio Difusora de Itajaí, transmitindo em 1530 quilociclos, leva ao ar............ A VOZ DO ESTUDANTE.........Meu Brasil, meu Brasil brasileiro....aquarela do Brasil, era a música prefixo do nosso programa........e com voz locução amadora, porém muito bem ensaiada e cheia de entusiasmo “ COM MAIS AMOR A JUVENTUDE; COM MAIS CONSCIÊNCIA DO DEVER CUMPRIDO; COM MAIS INTERESSE PELAS CAUSAS ESTUDANTIS, A UNIÃO DOS ESTUDANTES SECUNDÁRIOS DE ITAJAÍ, APRESENTA A VOZ DO ESTUDANTES”. Este era o prefixo do nosso programa, aí começavam as reivindicações pelas melhores condições de ensino para os jovens de Itajaí, da turma do meu tempo.....aí se plantou a primeira semente para o ensino superior que tanto enobrece a nossa Itajaí.
SAI DA JANELA.....
Lá pelos idos de 1960, ali onde fica o prédio novo dos correio, ficava a feira livre, que funcionava as quartas feiras, com grande movimento. Do outro lado da rua ficava o velho prédio do Colégio Salesiano de Itajaí, com suas paredes rentes a calçada, da Gil Stein Ferreira, para qual se abriam as janelas, das salas de aula, e ao fundo já na frente da travessa Dagoberto Alves Nogueira ficava a porta da capela, por onde entravam os convidados para as missas de domingos e as sessões acadêmicas e reuniões, já que sua função era dupla.
Este era o cenário,.....
Nas noites de terça-feira e madrugadas de quarta-feira, os moradores das rua Brusque e Blumenau, já estavam acostumados com o barulho das carroças de colonos, com sua toldas arredondadas e aqueles estranhos caminhões Opel ou GMC que desciam para feira, trazendo frutas e verduras da época, fresquinhas sem um pingo de agrotóxicos, ou carregadas de galinhas vivas em pequenos engradados, produtos de suínos defumados ou frescos, derivados de leite, doces de frutas e outros produtos do Brilhante, Limoeiro, de Luiz Alves, Ilhota, do Baú, e das regiões mais altas do rio Itajaí – Açu, como Pomerode, Timbó, até Rio do Sul.
Na cama ainda, já pensávamos de como seriam as aulas do dia da feira, ou planejávamos alguma para alguém assim que as aulas daquele dia terminassem lá pelo meio dia, e aquele chão ficasse apinhado dos restos de feira.
Era até engraçado..... na aula de religião, enquanto o padre falava que não devíamos acreditar no espiritismo, lá fora alguém gritava - Baixou, Baixou aquí ....o preço do aipim, ou na aula de geografia o professor interrogava de onde vieram os ameríndios, lá fora.....de Luiz Alves, de Luiz Alves a melhor farinha.
Nos divertíamos, sem poder rir, pois se risse...ao final da aula a conversa com o Pe. Conselheiro ia ser feia.
Numa quarta-feira na aula de história, lá pelas dez horas, quase na hora dos colonos começarem a ir embora ( as pessoas levantavam muito cedo para ir na feira) o barulho das galinhas sendo retiradas dos engradados, a gritaria para vender o final dos produtos....o barulho era infernal, o clérigo professor de história mandou que fechássemos todas a janelas, porém ele ao fechar a sua, olhou para a rua e muito rapidamente voltou para dentro da sala de aula e retomou a matéria, visivelmente constrangido. Este fato aguçou a nossa curiosidade, e assim que a aula acabou, nos precipitamos para a janela para ver o que tinha acontecido, e lá estava no para-choque de um caminhão ali estacionado – CURIOSA, SAI DA JANELA E VAI VER A PANELA .
O MDC.....
Não é nenhuma nova sigla, mas o velho Maior Divisor Comum, da velha matemática, esta artimanha da matemática que enrolou tanta gente e fez o personagem desta história passar por maus bocados.
Tudo aconteceu no Colégio São José, na parte velha, como era conhecida na época, hoje é aquela que fica ao lado das quadras de esporte.
Manhã de junho, sim era junho, pois naquela época os meses tinham cheiro, tinham cor, e junho tinha cheiro de laranja crava, de tainha frita e de lenha queimada nos fogões.
Na sala de aula 50 alunos da terceira série do primário, todos meninos, era a última turma masculina do Colégio São José, a partir do ano seguinte não aceitariam mais rapazes, quem reprovasse, deveria procurar outro colégio.
A professora.... Irmã Elenir, ela tinha um apito... parecia um sargento, para colocar-nos na fila e fazer silêncio, era por número de silvos, um para parar....dois para nos dirigirmos para a fila e três para ficar calado...ai de quem não ficasse, diziam que só ela era capaz de dominar aquela turma de indisciplinados.
Terminara o recreio, todos na sala de aula, após as orações e todos sentados... matemática...e o MDC.
Explicações, repete explicações e uma série de exercícios de sala de aula para fixar o dito cujo MDC....e o nosso personagem nada de conseguir resolvê-los, perguntar para a freira.....nem pensar....além da bronca a gozação dos colegas depois da aula.
O tempo ia passando, olhava no relógio que ganhara na primeira comunhão (no tempo em que relógio era presente) e o tempo avançava para o meio dia, e ele cada vez mais atrapalhado e nervoso, pesando que ainda tinha que levar para casa a irmãzinha, que já devia estar esperando embaixo daquela paineira que tinha no portão de saída, que dava para a rua Silva.
O sino anunciou o final da aula, começou a preparar o material, porém aquela voz cheia de autoridade anunciou – só sai quem terminou, os outros terminem....e só sairão quando terminar....complicou para o nosso personagem, não havia feito quase nada..., poderia fazer como alguns que não tinham terminado e foram embora, mas quis ser honesto e lá ficou.
Lá na cátedra a freira, corrigia cadernos, .... – quem acabar mostre-me e pode sair......e o nosso personagem cada vez mais enrolado, mais nervoso, a irmãzinha esperando embaixo da paineira, já deveria estar chorando, o MDC não dava certo, o relógio da matriz já anunciara o meio dia...levou para freira ver...o exercício, e ela ... está errado continue fazendo... - mas irmã....nem mais nem menos até acabar....será que ela não tem fome?
Armou a tática preparou o material, colocou perto da porta dos fundos, e foi mostrar o exercício, sabia que estava errado...sabia que a resposta era ... - continue fazendo... voltou para o lugar perto da porta pegou o material, e em desabalada carreira desceu a escadas, tomou o pátio, avistou a irmãzinha que esperava e gritou; Corre que ela esta vindo. A irmã que esperava sem compreender o que acontecia corria atrás dele, tomaram a rua, dobraram a esquina, e o caminho da casa....o que ocorreu depois nem te conto....
O ALEMÃO QUE COMEU O AIPIM CRU....
Quem será?
Adentra a sala de aula uma figura, mais exótica aos nossos olhos não podia parecer....calças curtas de couro até o joelho, com um tirante do mesmo material, camisa branca, meias até abaixo do joelho e um sapato marrom com fivelas niqueladas.
O cabelo espigado de tom avermelhado, olhos muito azuis, adornados por um óculos fundo de garrafa, uma face cheia de sardas; alguém baixinho falou - Olha o Pão de Milho,... antes de ser apresentado já estava batizado, e iria, a partir daquele momento, ser assim conhecido.
O padre conselheiro, apresentou:
- Este é um novo aluno, espero que seja bem vindo, apesar dos murmúrios e risinhos que já escutei, tratem-no bem, virando-se para a figura convoca-o:
- Diga seu nome para seus novos colegas!
- Eu me chamarr Bernie Hans Karl, e um palavrão de sobrenome, que para nós, não tinha o menor interesse, pois ele já era o Pão de Milho.
Nunca falava conosco, durante a aula, prestava muita atenção, tinha notas boas principalmente em Latim, onde nós tínhamos a maior dificuldade, pois o professor usava o seguinte critério de avaliação: tudo certo, dez; um erro, cinco; mais do que isso, um; não dava zero, mas em compensação, chovia um.
Durante o recreio, enquanto discutíamos futebol, jogávamos bolinhas de vidro, espirobol, ping-pong, pião e outras brincadeiras, ele ia para seu canto, e lá ficava, envolto nos seus livros e suas revistas escritas em alemão. Quando convidado a participar, respondia:
Eu não saberr esses xogos, gostarr mais te ler.
Em uma prova de Latim, duas frases quilométricas para fazer a análise lógica e traduzir, ...achar o sujeito era fácil, pior era o resto, os objetos, os predicados, os verbos e tudo aquilo que para nós misturados aos genitivos, ablativos e acusativos das declinações era uma confusão só.
A menor chance, mãos embaixo da carteira e a gramática do Padre Júlio Comba era aberta e aí com uma olhada aqui e acolá dava para salvar alguma coisa, apesar de saber que era um pecado que estávamos cometendo ao colar, e logo em Latim.
O Pão de Milho levanta a mão, o que será que ele vai perguntar? Ficamos atentos, será que alguma questão está errada? Qual será sua dúvida? Vamos prestar atenção, pode vir uma dica...
- Qual a dúvida Bernie? Pergunta o professor...
- Senhorr padrre, o Paulo , o Carlos Alberto e o Antonio estão colando.
Um frio correu pela espinha, as mãos suaram e não teve jeito, zero e ainda uma anotação na caderneta, que deveria vir assinada no outro dia pelo pai ou responsável.
Alemão traidor, deveria ser Nazista, com aquelas roupas, com aquela cara, deveria ser um dos espiões fugidos das telas do Cine Itajaí, de algum filme de guerra, deveria ser punido, para aprender a não entregar ninguém!
Plano de vingança arquitetado....estratégia preparada, para o final das aulas, sem muito alarde, nada de briga, pois se ocorrer, a coisa complica mais, conjecturas e, um plano perfeito...
Era quarta-feira, no largo do correio, os restos de feira, o alemão demorou para sair, pior para ele ... - Lá vem ele! foi o grito de quem cuidava da porta dos fundos da Capela, por onde o espião pretendia fugir, devidamente seguro, foi levado ao meio do largo do correio, uma raiz de aipim que sobrara da feira foi colocada em sua mão,
- Cadê aquele canivete que apontas o lápis?, Ele tinha um canivete sem ponta, daqueles de “picar fumo” que ele usava para apontar o lápis.
- Estarr no pasta..., não chorava, não reagia, parecia de pedra.
- Tira e descasca o aipim, assim foi feito.
- Agora come tudo, e ele comeu.
Uns cascudos, e foi solto, estávamos vingados, tinha comido do produto que melhor representa o nosso solo, a mandioca e in natura. Tomara que tenha uma bruta dor de barriga, e ponha para fora o péssimo defeito de ser dedo duro.
O PLACEBO
Para contar esta história, é necessário que definir a palavra título, Placebo ( do latim placere, significado “agradarei”) é o nome dado a qualquer medicamento ou procedimento administrado mais para agradar do que beneficiar o paciente. O placebo pode ser eficaz porque pode reduzir a ansiedade do paciente, revertendo assim uma série de respostas orgânicas que dificultam a cura espontânea.
Este episódio ocorreu no velho Colégio Salesiano de Itajaí, no prédio que se estendia ao longo da Rua Gil Stein Ferreira, e frente para a Rua Samuel Heusi. Na Samuel Heusi ficava um portão, encimado por um buraco que aos novos alunos era dito que fora feito para passar a cabeça de um professor muito alto chamado Nicolau, isso no tempo do Ginásio Itajaí. Por ele se chegava a duas entradas, a principal para quem seguia sempre a frente, que ia para a salas da direção, secretaria e do padre prefeito onde pagávamos as mensalidades, e em direção a esquerda para um portão por onde os alunos entravam. Havia ainda ali naquela esquina, um pequeno gramado, com o mastro da Bandeira Nacional, que era hasteada nos feriados nacionais e dias festivos.
As salas da direção se comunicavam com o lado interno da construção, por uma porta que dava direto no corredor onde se enfileiravam as salas de aulas, ladeadas por um pórtico que se abria em arcos para o pátio interno, lugar de jogos e recreios. No pórtico ficavam os bebedouros de louça branca, com uma torneirinha que esguichava água que servia para beber e molhar alguém “sem querer”. Aos poucos vamos recordando daquele local onde passamos alguns dos melhores anos de nossa vida. Havia aulas pela manhã para as segundas séries, dos repetentes, terceiras e quartas séries do curso ginasial, e tarde para o quarto primário, o admissão e as primeiras e segundas séries. Até 1967, o ensino era dividido em curso primário que ia da 1ª. a 4ª. séries, curso secundário, o ginasial da 1ª. a 4ª. série e o curso científico, curso normal, curso de contabilidade e o clássico. Para passar do primário para o secundário era necessário fazer um exame, chamado de Admissão ao Ginásio, com prova de Português eliminatória cuja nota deveria ser acima de cinco. Quem não fosse aprovado nesse pequeno vestibular, deveria freqüentar um ano de preparatório ao curso ginasial, que chamávamos de Admissão.
Numa turma de segunda série do período da tarde, na segunda aula, um professor leigo, adentrava a sala, era recebido com todos os alunos de pé, como mandava o regimento da época, após o “sentados”, fazia a chamada dos alunos, e antes de iniciar a aula dirigia-se a um aluno da primeira fila e pedia a ele para ir até a secretaria e trazer-lhe um “Melhoral” para sua dor de cabeça. Esse fato ocorria quase que todos os dias, eram cinco aulas daquela matéria por semana, que ia de segunda a sábado, eram cinco comprimidos para dor de cabeça.
Era muita dor de cabeça, um dia resolvemos botar a prova a veracidade daquela dor de cabeça, que tinha dia e horário, e preparamos um “Melhoral”, cortando de um pedaço de giz uma pequena parte muito semelhante ao comprimido, envelopado na embalagem. Ficamos aguardando a hora exata da aula. A mesma rotina, recepção, chamada, e a solicitação pelo “Melhoral”. O aluno simula ir até a secretaria e volta com o copo de água o comprimido preparado O professor dissolve e ingere o “Melhoral”.
Expectativa total, cinco minutos após, o comentário: - O “Melhoral” é o que me vale, é só tomar e logo passa esta minha dor de cabeça. Nos rostos eram só sorrisos, enfim aquela dor de cabeça era falsificada, como já desconfiávamos.
O RIO MADEIRA
Esta história é dos bons tempos do Colégio Salesiano, ocorrida no final de 1961, num dos famosos exames orais. Nos anos 50 e até 1961 o exame oral era obrigatório em todas as matérias, a partir de 1962 ficou instituído que somente os alunos que não conseguiam a média final deveriam prestar exames orais.
A avaliação do aluno era constituída de cinco notas mensais, abril, maio, agosto setembro e outubro. Em junho era feito um prova, chamada de primeira prova ou exame parcial onde era argüido o conteúdo do primeiro semestre, em novembro uma segunda prova, ou exame final onde era argüido o conteúdo de todo o ano letivo. Além disso, havia a prova oral, obrigatória, que junto com a as duas anteriores através de média aritmética obtinha-se a média final. Era considerado aprovado o aluno que obtinha no mínimo, média quatro em cada matéria e média cinco no conjunto das matérias. Ah! As matérias para uma segunda série do curso ginasial, equivalente hoje a sexta série, tínhamos: Instrução Religiosa, Português, Latim, Francês, Inglês, Matemática, Ciências Naturais, História Geral, Geografia do Geral, Trabalhos Manuais, Desenho e Canto Orfeônico, alem da nota de Comportamento.
Todo mês era feita uma classificação de acordo com as médias mensais, além de um controle rígido da freqüência, inclusive com a presença das missas dominicais e dos dias santificados e festivos.
Bem, para a tal exame oral, em aulas do final do ano o professor marcava a matéria a ser argüida, e para cada capítulo era instituído um número, “o ponto” que seria sorteado na hora da prova na frente do aluno.
Todos ficavam fora da sala de aula, a uma distância razoável, espalhados pelo corredor, estudando e esperando aqueles que saiam para saber que ponto caiu e o que foi perguntado aproveitando o momento para dar mais uma olhadinha, nas respostas, consultado os livros e os cadernos.
A entrada era pelo número de ordem de chamada, eu era o 41, o Ricardo Cunha 0 42 e o Salim Schead dos Santos o 43, a medida que se aproxima a hora o nervosismo e a tensão aumentava.
Dentro da sala, como num tribunal atrás das mesas três professores, o da matéria e dois interrogadores,cada um dava uma nota, a média era a nota da “oral”, e na frente da mesa em uma cadeira o aluno a ser examinado, geralmente branco, lívido, mesmo que sabendo tudo, era o medo de dar um branco.
- Trinta e sete, chamou a banca, o Luiz Carlos entrou...
Boa sorte, desejamos do lado de fora, era o Exame oral de Geografia. Após uns vinte minutos saiu da sala, indignado.
- E ai, como foi? - Mais ou menos, mas consegui a nota, eles disseram. Mas como eu fui esquecer, o Lima, (o Clérigo Pedro Lima) perguntou os sete principais afluentes da margem direita do rio Amazonas, e eu esqueci um, e para me deixar mais nervoso o Pedro Baga, (professor Pedro Ghislandi) ficou batendo com o dedo na mesa.
- Mas o que tu respondestes?
- Javari, Juruá, Purus, Tapajós, Tocantim e Xingu, só seis, ....faltou um.
- Sim, e de que é feita a mesa que o Pedro Baga batia...
- Madeira, ah! como sou burro, faltou o Rio Madeira.
GYMNASIUM
Alguém lembra desse nome? Ah! Lembrou era do nosso livro de latim, sim no nosso tempo, em colégio de padre como chamavam, tínhamos que estudar latim, entre outras línguas como o Inglês e o Francês. O autor era o Pe. Júlio Comba, Salesiano, da editora Escola Dom Bosco, publicado em 1961 – GYMNASIUM: 3º. A 4º. Ano de latim. Na segunda página centrado estava o IMPRIMATUR, com as armas da diocese onde fora editado. O imprimatur é uma declaração, em latim, oficial da igreja católica que diz que um trabalho literário ou similar não vai contra as idéias da igreja e que é uma boa leitura para qualquer católico. Em latim Imprimatur significa “deixem-no ser impresso”. Era-nos recomendado que qualquer livro que fosse lido deveria ter o imprimatur.
Bom, o estudo do Latim começava cedo, já na primeira série do curso ginasial e ia até a quarta série, nas duas séries iniciais usava-se o GYMNASIUM: 1º. e 2º. Ano de latim e nas duas subseqüentes O GYMNASIUM: 3º. A 4º. Ano de latim.
Folheando as primeiras páginas lá estava escrito “o latim possui duas formas básicas: clássico( ou erudito) e eclesiástico. O clássico é considerado a forma culta, e está vinculado aos filósofos como Sêneca, Cícero e César, o latim eclesiástico surgiu a partir da era cristã do império romano, e foi difundido por Santo Agostinho, São Ambrósio, São Jerônimo entre outros.”
Folheado-o lá estavam elas as terríveis declinações: “a primeira declinação do latim é a forma clássica de uma desinência adicionada ao radical latino”.
Singular da primeira declinação: nominativo Rosa; genitivo Rosae; dativo Rosae; acusativo Rosam; vocativo Rosa; ablativo Rosa. Plural da primeira declinação: nominativo Rosae; genitivo Rosarum; dativo Rosis; acusativo Rosas; vocativo Rosae; ablativo Rosis.
Seguiam-se as cinco declinações, que se dividiam em seis casos básicos cada, que para serem corretamente declinados, ai é que o bicho pegava, devia-se decompor a frase e analisa-la sintaticamente.
Tínhamos como professor o clérigo Lima, o Pedro Lima, cuja avaliação era tudo certo 10, uma palavra errada 5, mais de duas palavras erradas, 1, é isso mesmo nota UM, nas provas era um festival de nota um.
Em uma das aulas, foi nos dado para interpretar a seguinte frase: “Philosophum non facit barba”, após uns dez minutos, ele chamou o João Machado, para nós o Machadinho.
- Machadinho, como ficou a tua interpretação:
- Essa é muito fácil: “O filósofo não faz a barba”, não precisava nem interpretar é só ver as figuras deles no livro, é tudo barbudo.
- Um de nota seu Machado, o correto é: “A barba não faz o filósofo”, sente-se.
O Machadinho sentou-se falando baixinho: - Porque estudar este latim, se eu não quero ser padre.
Esperávamos um sermão do clérigo Lima, mas ele não disse uma só palavra sobre o comentário do João, e continuou a aula, falando da tal análise, das frases, orações e períodos, palavras, termos essenciais da oração, etc...
Na aula seguinte de latim, no lugar do clérigo veio o padre Pedro Baron, um silencio total na sala: Todos se puseram de pé:
- In nòmine Patris, et Fìlii, et Spìritus Sancti.
- Amen
- Sentados, vim aqui buscar um rapaz para levá-lo ao seminário de Ascurra, e o olhando paternalmente para o Machadinho, continuou, o Latim não é só a língua dos padres, mas a Língua Latina é a mãe de várias outras línguas como Português, que vocês falam, Espanhol, Francês, Italiano da minha Itália, Romeno, Provençal, Rético, Catalão, Sardo. Portanto estudar latim é importante para a formação de vocês, que alem de ajudá-los a entender o Português, servirá para o estudo de outras ciências como a biologia e a química. Senhor João, deixe os filósofos com a sua barba.
- De pé: “ Dòminus vobìscum.
- E nós Et cum spiritu tuo.
E saiu da sala. E o Lima entrou na sala com cara de vitoriosos e com aquele sorriso dele de dente torto.
A CADERNETA ESCOLAR
Quem pode esquecê-la, era nossa companheira de domingo a domingo, sem ela ninguém entrava no Colégio, nos nossos tempos de alunos do Salesiano. Das minhas ainda tenho três, guardadas que foram pela minha mãe, que as me repassou, quando já adulto, não sei se para que só as guardasse como recordação, ou para nunca esquecer as mensagens que elas trazem em seu interior.
Peguei uma delas, sobre a capa de cor preta na parte superior a inscrição – COLÉGIO SALESIANO ITAJAÍ - seguido de ITAJAÍ – Sta. Catarina. No centro uma abertura onde era colocado o nome do aluno, seu número de chamada e a série, e logo abaixo sob a capa EXTERNATO – CADERNETA ESCOLAR.
Na contracapa: “È de suma importância que os Srs. Pais ou Responsáveis examinem a Caderneta Escolar todos os dias”.
Ela era cheia de mensagens e ensinamentos, e nos chamava de “MEU AMIGO”, e dizia
A tua caderneta é o espelho da tua vida escolar
È o índice da tua Educação.
É um documento para o presente e para o futuro.
Tem com ela o máximo cuidado.
Além disso, ensinava ao amigo, andar corretamente nas ruas, a saudar os mestres, a engraxar os sapatos, a não deixar seus rastros nas paredes e nos móveis, a não atirar “pedras” a não fumar, e fechava com a frase: MOÇO! Respeita a tua mocidade.
Nas páginas seguintes alguns pontos do Regulamento Interno, dos quais destaco dois:
5 – Haverá anualmente três dias de Retiro Espiritual.
6 – Aos domingos e dias santos de guarda, os alunos devem assistir a missa.
Nas páginas seguintes os meses letivos, com o carimbo de presença em cada um deles e o de missa aos domingos no fecho a assinatura do responsável, na pagina ao lado espaço para Observações – Avisos – Justificações (Era o lugar das terríveis anotações).
Lá pela metade o Boletim Escolar, e nas páginas finais as orações que começavam com as da Manhã, e acabavam com a oração a N. Senhora Auxiliadora, passando pelo exercício da Boa Morte (outra hora eu comento)
Entre as páginas do controle de presenças, na parte superior a marca amarelada do dedão, pois todos os dias ao adentrar ao colégio para assistir as aulas, a caderneta deveria ser mostrada aberta na página do mês, para o padre conselheiro que ficava no portão recepcionando os alunos e verificando se estava tudo em ordem. Se tivesse faltado o carimbo de presença as aulas dos dias anteriores o carimbo da missa do domingo, ou a assinatura das anotações, não entrava no Colégio para as aulas, ao menos que estivesse justificada pelo responsável.
Ao final das aulas as cadernetas eram devolvidas, era aquela expectativa, pois se ela não fosse devolvida, o aluno deveria buscá-la na sala do padre conselheiro, pois alguma irregularidade havia ocorrido, uma tarefa não feita, uma lição não sabida, ou um comportamento impróprio, esta ida até a secretaria, para ganhar uma “anotação” era um Deus nos acuda porque a cobrança em casa era severa.
Alguns, eram assíduos freqüentadores da fila do tio “Consa”, como era chamado o padre conselheiro, quem esquece do Nestor Junkes, do Otavio Bortolini, o Áureo Mayr e o terrível Antonio Possamai.
Jasiel era um dos freqüentadores quase diário do gabinete do conselheiro, ao ser questionado o porquê de estar sempre lá respondeu:
- Seu Padre, a minha mãe falou que era para mim aproveitar tudo, principalmente os conselhos, por isso venho sempre aqui para recebe-los, já que a mensalidade é tão cara.
Ah! No final na contracapa o controle de pagamento das “prestações” (mensalidades).
O QUE DISSE JESUS
A formação religiosa no Colégio Salesiano, nos anos sessenta era obrigatória e fazia parte de todas as séries. No regulamento interno havia as “Obrigações Religiosas”, donde destacamos: “Não podem ser alunos do Ginásio os que pretendem ser dispensados da aula de religião e da assistência às práticas de piedade do Ginásio”.
Anualmente havia três dias de “Retiro Espiritual” e aos domingos e dias santos de guarda era obrigatório assistir as missas.
O livro de Religião chamava-se “Luz do Céu”, da editora Salesiana, era composto de textos de leitura seguidos de perguntas que deveriam ser respondidas em casa como tarefa, para a aula seguinte. No final do livro tinha um questionário, com perguntas e respostas que deveriam ser decoradas, principalmente para os exames escritos e orais,
Todos os anos eram realizados os “combates de religião”, baseado neste questionário. Eram feitas perguntas e aqueles que não sabiam responder exatamente com estavam às respostas, com pontos e vírgulas, eram eliminados das provas, ficando somente os acertadores. E assim eram feitas tantas perguntas até que um aluno de cada sala era o que iria representar a turma no grande dia. Neste dia eram reunidos todos os alunos na capela, onde era repetido o processo até que apenas um aluno do Colégio se tornava o campeão, que no final do ano era condecorado com uma menção honrosa e uma medalha.
Todos os dias após o sinal, todos se reuniam em filas no pátio nos dias de sol e nos corredores nos dias de chuva. Um banquinho era colocado e sobre ele subia o padre Conselheiro, para dar os avisos, e após ele um outro padre para dar uma mensagem de formação religiosa, na qual deveríamos prestar muita atenção, pois ela poderia ser cobrada em uma aula daquele dia.
Bom mesmo eram as confissões durante as aulas, principalmente no início da aula quando estava sendo feita a chamada oral de alguma matéria. A saída da sala de aula para ir até a capela, e o tempo de confissão durava até que aquela aula acabasse. Para muitos era um alivio, quando o Irineu, que era o bedel, anunciava: - Tem confissão na capela, o professor se quiser pode dispensar.
Nas paredes do colégio existiam os quadros murais, com mensagens, tabelas de jogos e de pontos do campeonato de futebol interno, e frases religiosas, que deveriam ser lidas e decoradas, pois com certeza seriam apreciadas em alguma aula de religião.
Numa das aulas, o Pe. Baron que era o professor de Religião chama um aluno e pergunta:
- Menino Joel, o que disse Jesus?
- Seu padre, infelizmente eu cheguei em cima da hora, e não deu tempo de ler o mural.
- Continue de pé, menino Joel.
- Vamos ver quem... Menino Emilio o que disse Jesus?
- Seu padre, se para o Joel que é de família católica, o pai dele e a mãe estão sempre na igreja, não perdem uma missa, ele é até coroinha, ele não disse nada, o senhor acha que para mim ele ia dizer alguma coisa?
Bem vocês devem imaginar o que aconteceu com o Emilio....
O PICOLÉ DE COCO
Quando voltávamos das férias de julho, que nos nossos tempos tinha 31 dias, já começavam os preparativos para o desfile do dia 7 de setembro.
No período contrário ao das aulas às reuniões para ver quem ia desfilar com bicicletas, que deveriam ser as mais novas e bem conservadas, e após as aulas da tarde as reuniões para distribuição dos instrumentos e marcação de lugares para os que iriam tocar na fanfarra.
Nas aulas de Educação Física, após os exercícios de rotina o condicionamento dos passos da marcha, - esquerdo direito, esquerdo direito, barriga pra dentro.... Peito pra fora... Cabeça erguida, sem risos nem conversas, atenção... Sentido, um, dois, três. Não se mexam vocês estão em posição de sentido. Corrijam os que estiverem errados, mão espalmada sobre a coxa, cabeça erguida. Atenção descansar... Vejam, partindo da posição de sentido, afasta-se o pé esquerdo lateralmente elevando-se o corpo sobre o pé direito, o braço esquerdo e o direito juntam-se nas costas na altura dos quadris.
- Atenção, cobrir! Reparem o braço direito é colocado sobre o ombro do mesmo lado do companheiro da frente... Tomem distância. Agora firme... Direita, esquerda, meia volta volver, parece que ainda ouço as vozes de comando dadas naquele pátio de terra, que também era nosso campo de futebol, pelo professor de Educação Física o Tenente Fonseca ou o Capitão Praun.
Ensaios de marcha, primeiro nas séries, depois por períodos e aos sábados quando todos do colégio se encontravam, pois os do período matutino tinham aulas das sete e trinta até nove e trinta e os do vespertino das dez ao meio dia, eram efetuados os ensaios gerais. Primeiro dentro do pátio do colégio e depois nas ruas Felipe Schmidt, Camboriú, XV de novembro, Gil Stein Ferreira. Nos ensaios as correções, - acerta o passo! Esquerdo direito, - olha o alinhamento! - sempre pelo companheiro da direita. – olhem para a nuca colega da frente! Muito bem!
Na volta ao colégio com o ensaio do toques de corneta. O “corneteiro mor” interpretava o toque de atenção, de sentido e descansar. Ouvíamos a avaliação do ensaio, - “Não queremos ser os mais bonitos, mas os melhores em garbo e disciplina, nossa pátria merece esta homenagem” eram as palavras do Pe. Pedro Baron. Depois os avisos e em posição de sentido ouvíamos a Marcha Batida tocada pela fanfarra para encerrar.
No dia do desfile cedinho estávamos no colégio uniformizados, no Salesiano o uniforme era usado só nos dias de solenidades. Ah! O uniforme, calça branca, blusão branco com gola e punhos azuis o escudo do colégio em cor também azul com suas estrelas brancas, sapatos e meias pretas. Com o uniforme tínhamos que ter o maior cuidado, pois ele era muito fácil de sujar, era tudo branco, sentar nem pensar, quando ocorria uma pequena mancha, tratávamos de passar giz para escondê-la.
Saiamos para o desfile, na frente sobre duas bicicletas um grande escudo de madeira onde se lia - GINÁSIO ITAJAÍ-. Seguiam as bandeiras e logo após as bicicletas decoradas com papel crepom verde e amarelo, trazendo sobre o porta farol um suporte com três bandeira, a do Brasil ladeada pela de Santa Catarina e a do Vaticano. A fanfarra, tocando a plenos pulmões dos corneteiros, contagiava os pelotões e nos enchiam de orgulho. A saída era a Praça Vidal Ramos, subindo a Rua Hercílio Luz até a Igreja Nova (como chamavam a Igreja Matriz). Ao passar na frente do Colégio Victor Meirelles (onde hoje é a casa da cultura) as meninas que já haviam desfilado nos aguardavam para em coro gritar: - PICOLÉ DE COCO, PICOLÉ DE COCO.... Era aquele uniforme todo branco.... Maldito apelido.
AS AULAS DE CIÊNCIAS
As “aulas de ciências”, era como chamávamos as aulas de Ciências Físicas e Biológicas, matéria que me seduziu e que me levou a cursá-la tendo nela me graduado e especializado em uma das suas cadeiras a Química.
Reportamo-nos aos anos 1962 e 1963 e ao Colégio Salesiano Itajaí, onde cursávamos o ginasial, e tínhamos aulas de ciências, com um professor comprometido, que nos conduziu pelos conhecimentos que até hoje recordamos, e que foi um exemplo que segui em meu Magistério.
Obrigado Nestor Junckes, nos nossos tempos o Pe. Nestor, que hoje mora em nossa Itajaí , ou melhor, sempre foi “papa-siri”, pois nasceu em Luiz Alves , que naquele tempo pertencia a Itajaí. Você foi responsável pela formação de muitas gerações, com seu exemplo, seu comprometimento e com seus ensinamentos.
Ciências Físicas e Biológicas eram lecionadas na terceira e quarta séries do curso ginasial, pois os conteúdos da geologia (solo, ar, água) e de alguns da botânica eram diluídos na Geografia.
Na terceira série estudava-se o corpo humano, e na quarta série, todas as noções de física e química, e complementos da Biologia.
Tínhamos as nossas coleções de rochas, devidamente classificadas, que íamos buscar lá na fabrica de cimento, em Salseiros, ou encontradas nas pilhas de granito, que foram usadas na construção do “colégio novo”, eram quartzos, arenitos, micas e feldspatos etc.
Nas aulas da terceira série, ao adentrarmos a sala de aula éramos recebidos pelo esqueleto (que diziam ser verdadeiro) postado na frente da classe, para estudamos os ossos, frontal, occipital, artelhos e falanges, falanginhas, falangetas.
Os “esfolados”, torsos de cerâmica, que representavam todos os músculos e que podiam ser desmontados, mostrando a posição, a cor dos órgãos internos, sua estrutura e suas partes.
Eram-nos dados trabalhos de pesquisa, que deveriam ser apresentados no final do semestre, e para tanto deveríamos visitar o consultórios médicos para a coleta de revistas e folhetos que discutiam o assunto. Ganhei e guardava com certo orgulho uma publicação de um laboratório, uma “transparência anatômica – La Pierna ” que mostrava a perna com todas as suas veias, artéria, e músculos como se fosse dividida em fatias.
Na quarta série, para as aulas de química, precisamos apresentar um trabalho, cuja reação podia ser feita em qualquer frasco, mas resolvemos incrementar, e para tanto precisávamos de tubos de ensaio. Mas como obte-los em Itajaí naquela época? Para tanto fomos aconselhados a procurar na Farmácia Brasil, do seu Heitor Liberato, na Rua Lauro Muller hoje a Clinica São Lucas.
Entramos na sala da frente, espaçosa, com seus armários de madeira com portas de vidros, atrás das quais estavam expostos os medicamentos protegidos da poeira e do calor, havia um balcão enorme de madeira onde as pessoas eram atendidas e enormes vasos de porcelana, como que decorando o ambiente.
- Boa tarde, por favor, por obséquio vendem tubos de ensaio? Falamos com a balconista.
Da sala ao fundo, uma voz questionou: - Quem é?
- Dois meninos, alunos do salesiano, seu Heitor.
- Mande-os entrar.
Entramos em outra sala, mais ao fundo, recipientes de porcelana, vidros, balanças de precisão, frascos, e um senhor sentado atrás de uma escrivaninha, que para nós pareceu ser possuidor de poderes mágicos ou dono de segredos inimagináveis dado ao ambiente .
- Boa tarde, para que vocês querem tubos de ensaio, posso saber?
- Para uma experiência de ciências. Explicamos o que iríamos fazer.
Ele foi até uma gaveta, dela retirou três tubos novinhos e nos deu.
- Mas só precisamos de dois.
- Levem três, podem quebrar um, aceitem como uma colaboração aos seus estudos.
Foi a eletrólise mais sofisticada feita no colégio e tivemos a melhor nota. Guardei aqueles tubos de ensaio por muito tempo como jóias raras.
O CALEIDOSCÓPIO
Início de ano letivo, primeiros dias de aula, a ansiedade para o reencontro dos colegas e a curiosidade tomava conta de nós. As conversas se transformavam em uma série de questionamentos: Quem tinha ficado no colégio? Quem tinha saído? . padres, algum tinha sido transferido? Quem viera em seu lugar? E os Clérigos, eram os mesmos?
Enquanto a conversa discorria, os que chegavam iam se agregando a rodinha, abraços de boas vindas, brincadeiras, até que alguém aponta para a porta o fundo do corredor, que levava a sala dos professores:
- Ei! Quem é aquele?
Baixinho, cabelo ruivo, sardento, de óculos vestindo batina preta, adentrava ao pátio, trazendo numa das mãos uma baqueta de tambor, e na outra um ou dois livros e um diário de classe.
- Padre ou Clérigo? Pela idade deve ser clérigo.
- É o Mussolini, alguém sugeriu.
- Calma pessoal! Vamos conhecê-lo melhor, sugeriu outro.
Apesar dos cumprimentos, e da tentativa de trazê-lo até a rodinha, apenas devolveu o cumprimento e dirigiu-se para a porta da sala do segundo ginasial A.
- Xiii! Vai dar aula para nós.
Na sala de aula:
- Meu nome é Clérigo (vou omitir o nome verdadeiro, tentem descobrir) “Pesadelo” e darei as aulas de História das Américas, e comigo deve ser assim... assim...etc. e tal.
A sugestão tinha sido correta, era o próprio Mussolini.
Gostava de apelidar todo mundo, mas não gostava de ser chamado de apelidos, apesar de ter os mais variados, “pão de milho”, “sabugo”, “queijinho azedo”, “canelado”, etc.
Quando alguém era apanhado no recreio aprontando, fazendo alguma coisa que não lhe agradasse, riscava com a inseparável baqueta um pequeno circulo no chão do pátio, e o coitado era colocado dentro sem poder se mexer até o final do recreio.
AH! era muito curioso, se alguém trazia um livro, uma revista um objeto tinha que vistoriar, saber o que era e para o que servia.
Numa aula de Ciências, foi falado do caleidoscópio ou calidoscópio é um aparelho óptico, com pequenos fragmentos de vidro colorido, que, através do reflexo da luz exterior em pequenos espelhos inclinados, apresentam, a cada movimento, combinações variadas e agradáveis de efeito visual. Foi sugerido que construíssemos o nosso próprio caleidoscópio e trouxéssemos para a aula.
Fomos à luta, nas marcenarias conseguimos os espelhos, o papel vegetal nas papelarias, a goma arábica e assim construímos os caleidoscópios, e alguns não esperaram o dia de apresentar e trouxeram antecipadamente para mostrar aos colegas durante a entrada das aulas e nos recreios.
Quando o “Mussolini” botou o olho veio direto, para ver o que era e como funcionava, e até gostou do aparelho.
Num dos dias seguintes o João Machado, chegou com seu caleidoscópio, ele era especial e diferente, era grande o diâmetro tinha quase 10 centímetros , “Mussolini” ao ver a rodinha com o caleidoscópio, voou cheio de curiosidade, para olhar, o que lhe foi permitido imediatamente.
Ao levar a ocular aos olhos, ficou vermelho, atirou o objeto longe e gritou:
- Todos para a secretaria já!
O João tinha tirado os espelhos e colocado uma foto de uma mulher de biquíni no lugar do papel vegetal.
MANHÃ DE DOMINGO
Na minha infância, e na minha juventude, Domingo era dia de ir à missa, ainda mais par quem era aluno do Colégio Salesiano Itajaí, cuja freqüência às aulas de segunda feira era condicionada ao carimbo de MISSA ou a assinatura do celebrante na caderneta escolar. Estava no Regulamento Interno: “Aos domingos e dias santos de guarda, os alunos devem assistir à missa”.
E ia-se à missa, usando a melhor roupa que tinha, com sapatos pretos muito bem engraxados, camisas engomadas com “goma de araruta” e calça vincada a ferro quente. Até que vieram (ufa) as camisas “volta ao mundo” que era só passar uma aguinha e já estavam prontas para usar e as calças de “Nycron que nunca amarrota nem perde o vinco”.
Sou do tempo, tinha-se os roupas de andar em casa e roupas de ir à missa, quando alguém aparecia com uma roupa mais transada, logo vinha a piadinha:” Roupinha da missa heim!
Assim que se abriam os portões do colégio, lá pelas sete e meia da manhã, os primeiros começavam a chegar e se agruparem no pátio a espera do sinal. Ao sinal formava-se a fila para receber o carimbo de presença da missa e entrar para a capela, pois pontualmente às oito horas começava a missa, não era admitido qualquer atraso.
Terminada a missa, todos retornavam ao pátio onde eram recebidos ao som de músicas espanholas, uma passada na cantina para o lanche, um sanduíche de mortadela e uma laranjinha da Max William. Esse lanche era necessário, já que para receber a eucaristia era exigido jejum de alimentos sólidos de doze horas e líquidos uma hora antes da antes da comunhão.
Do lado da secretaria surgia o Pe. Nestor (Nestor Junckes), com um apito pendurado no pescoço e as camisas que seriam distribuídas aos jogadores, dos times avulsos ou dos campeonatos, cujas rodadas seriam realizadas naquela manhã. Eram necessárias somente as camisas, pois o calção cada um já trazia de casa por baixo da calça e todos jogavam descalços, tênis ou chuteiras nem pensar, muito menos grama, pois o campo era de barro batido. Os times avulsos eram formados na hora, nos domingos que não tinham jogos dos campeonatos, bastava pagar a taxa de lavagem das camisas.
Os times dos campeonatos eram previamente formados, geralmente pelos alunos que jogavam melhor, tinham tabela de jogos e de pontos perdidos afixadas no mural do colégio, e até torcidas formadas dos amigos e simpatizantes dos jogadores.
Lembro-me de quatro deles, e seus nomes eram associados às cores das camisas, o “Brasilzinho”, de camisas amarelas, o “Carlos Renaux”, com listas perpendiculares vermelhas, azuis e brancas, o “Flamenguinho”, com faixas paralelas vermelhas e pretas e o “Real Madrid”, camisas brancas com uma faixa vermelha cruzada sobre o peito.
A cronometragem era feita pelo Nestor, que apitava para mudar de lado, e no final do jogo, que ao terminar imediatamente iniciava-se o outro, não havia tempo a perder, pois a manhã era pequena.
Os jogadores suados, não tinham vestiários nem chuveiros. Lavavam os pés na torneira de jardim secavam os pés ao tempo, jamais na camisa o que dava pena de suspensão dos próximos jogos, repunha as calças, meias e os sapatos em uma sala de aula, que ficava a disposição dos jogadores e servia de vestiário.
Para os que não conseguiam vaga para o futebol ou não eram adeptos, tinha o ping-pong, ou o espiribol ou espirobol, um jogo bastante divertido e muito concorrido, onde é fincado um poste no chão e em sua ponta fixada a uma corda com uma bola com formato de gota. A bola não pode ser segurada, chutada ou socada, apenas batida com a mão. A regra é fazer com que a corda se enrosque no poste até que a bola não tenha mais como girar.
Todas estas atividades eram coordenadas pelo Nestor Junckes, auxiliado por um clérigo, no nosso tempo, o Davi Proença, o Justino Giradi e o Pedro Lima, que exercia uma grande liderança sobre os alunos, mas contra o qual ninguém gostava de jogar, pois jogava de batina e escondia a boca embaixo dela dificultando ao adversário.
Manhãs de domingo dos meninos do meu tempo, que acabavam com um “almoço de domingo” reunindo à mesa a família inteira.....
O CLÉRIGO VIGIA
Nos nossos anos de Colégio Salesiano, os “Clérigos” foram personagens importantes, na nossa formação, e este caso me foi contado por um deles muitos anos após, em um encontro em Porto Alegre , quando fomos representar o Colégio Salesiano Itajaí, onde lecionávamos e presidíamos a Associação de Professores.
A palavra Clérigo indica aquele que está se preparando para a ordenação como diácono ou padre.
Entre os primeiros Salesianos, a maioria era composta de clérigos, isto é, jovens destinados ao sacerdócio, que auxiliavam Dom Bosco, nos oratórios festivos e na educação de jovens, creio que este é o motivo da valorização que é dada aos clérigos na Congregação Salesiana.
Quando os Salesianos chegaram a Itajaí no dia 02 de fevereiro de 1956, a fim de assumirem a direção do Ginásio Itajaí, até esta data, dirigido por uma S/A o Padre Pedro Baron trouxe consigo um clérigo, o Clérigo Agenor Passos.
Não cheguei a conhecê-lo, pois meu ingresso no Colégio Salesiano deu-se só em 1958, na quarta série primária (o quarto primário, como era chamado) e lá encontrei o Clérigo Ladeira, baiano, que foi embora em 1959.
No período que lá freqüentamos como aluno até o ano de 1963, muitos clérigos passaram pelo colégio, como o Davi Vegini, o Erlindo, o Clinio, que diziam não haver resistido ao assédio das moças numa procissão de Corpus Christi, e foi embora no mesmo ano que chegou. O intransigente e mal humorado Delírio Poltronieri, e os que mais marcaram a sua passagem pelo colégio o Justino Girardi, o Mauricio Proença, e o Pedro Lima de um coleguismo e uma liderança inigualável.
Bem vamos ao caso, os ladrões resolveram visitar o Colégio, arrombaram a secretaria e levaram maquinas de escrever, e outros objetos de valor, deixando os padres em alerta e obrigando-os proceder aos devidos cuidados com o reforço das portas e janelas.
Alguns meses após, no início da noite a Cantina começou a ser visitada periodicamente, dela desaparecendo o troco da caixa e algumas caixas de balas e chocolates.
O P. Baron resolveu tomar uma providência um tanto inusitada, chamou o dito Clérigo que me contou a história e pediu:
- Clérigo (vou chamá-lo assim), hoje vou pedir para fazeres um serviço especial, como sabes estão roubando na nossa cantina e poderias nos ajudar a pegar o ladrão.
- Pois não, seu padre diretor, mas como devo proceder?
- Clérigo, hoje à noite, tu ficarás de vigia até lá pela meia noite dentro da cantina para pegares o ladrão. (Não podia se negar tinha o voto de obediência).
- Mas padre diretor, o ladrão pode estar armado ou me agredir.
- Por isso usaras isto aqui, e tira do bolso da batina uma pequena garrucha, colocando-a na mão do Clérigo, acrescentando - e como bom gaúcho deves saber atirar.
- Até sei seu padre, mas se eu matar o ladrão vou parar no inferno, pois estarei pecando contra os mandamentos da lei de Deus e ainda poderei parar na cadeia.
- Clérigo, isto uma boa confissão resolve, e quanto à polícia alegaremos legítima defesa, fiques tranqüilo.
À noitinha, o Clérigo colocou-se de vigia dentro da cantina, as horas se tornaram longas e o tempo não passava no seu pensamento já via o ladrão morto, estirado a sua frente todo ensangüentado.
Perto da meia noite resolveu examinar a garrucha, e para seu espanto viu que ela não tinha uma única bala.
Suspirou aliviado, e foi dormir tranqüilo. Ah! O ladrão não apareceu....
A CONFISSÃO E O PECADO
Diziam que quem completasse nove anos e não fizesse a primeira comunhão ia para o inferno, por isso, aos oito, já alfabetizados íamos para a catequese, para fazer a primeira comunhão.
Nossas aulas de catequese foram dadas pelo Cônego Wandelino, depois se tornou Monsenhor, e a sala de aulas ficava numa pequena casinha de madeira ao lado da Igreja Matriz, junto com as outras barraquinhas preparadas para as festas.
As aulas finais da catequese eram de treinamento, uma simulação da confissão e da eucaristia que chamavam “ensaio”. A eucaristia era ensaiada com uma hóstia não consagrada, que deveria ser engolida sem morder; “o maior medo que tínhamos era de morder a hóstia, além de ser pecado, diziam que saia sangue se mordêssemos”.
Bem as confissões eram dadas naqueles confessionários grandes de madeira entalhada da igreja matriz, nele formávamos filas nos dois lados, entrava o pecador da direita, depois o pecador da esquerda, e iam se alternando.
Tudo começava pelo exame de consciência, não podia esquecer nenhum pecado, pois invalidava a confissão, por isso a maioria fazia uma lista e decorava os delitos cometidos durante a semana. Após a primeira eucaristia, tinha que comungar todos os domingos, e diziam que comungar sem confessar não valia.
A lista de pecados era quase a mesma de todas as semanas:
- Desobedeci aos meus pais.
- Falei nomes feios; (alguma coisa sempre escapava, era automático. Não é?).
- Briguei com minha irmã.
- Menti: (este certamente por coisas de pouca importância, sem maldade).
Ficávamos, enquanto esperávamos a nossa vez na fila, medindo os pecadores pelo tempo que levavam para rezar a penitência, se demoravam muito era porque seus pecados eram graves (pecados mortais) se demoravam pouco eram pecados leves (pecados veniais).
Quando fomos para o Colégio Salesiano, a confissão passou a ter outra utilidade além do perdão dos pecados, safar de uma chamada oral, ou matar uma aula chata.
As confissões ocorriam durante as aulas, principalmente no início da aula quando estava sendo feita a chamada oral de alguma matéria. A saída da sala de aula para ir até a capela, e o tempo de confissão durava até que aquela aula acabasse. Para muitos era um alivio, quando comentavam antes das aulas: - Hoje vai ter confissão.
Às vezes o professor questionava a demora, mas sempre vinha à desculpa da confissão bem feita, a demora do exame de consciência, da penitência. Certa vez foi aconselhado, trazer de casa uma “colinha de pecados”, ou seja, uma folha de papel onde se escreviam os pecados, mas a idéia não prosperou, pois um colega podia pegar a lista e ai já viu né!....Ou acontecer o que aconteceu com o “Curvina”, que o Clérigo pegou a lista dos pecados dele, pensando que era um bilhetinho, daqueles que passavam durante as aulas.
Mas o caso mais grave aconteceu com o “Milímetro”, que era o mais novo da turma, e tinha este apelido por ser magro como um palito, óculos de fundo de garrafa, os cabelos desordenados e bom em matemática.
Quando chegava à quarta série ginasial, o que hoje corresponde à oitava série fundamental, durante a confissão, o confessor, passava orientações de educação sexual, para os alunos, pois era a última série do colégio e já éramos considerados jovens.
Após a confissão dos pecados, na hora do aconselhamento, o padre confessor orientou o “Milímetro”, como a todos nós:
- Meu jovem, você sabe fazer a higiene de seu órgão sexual?
- Mais ou menos...
- Então, quando você tomar banho, afaste.... Passe o sabão.... Esfregue bem, e lave com bastante água.
- Algumas semanas após, fomos à casa do “Milímetro” estudar matemática e a mãe do dele nos interrogou:
- O que aconteceu lá no Colégio? Foi discutida alguma norma de higiene? É que o meu filho que antes era um trabalho para tomar banho, agora ele quer tomar dois a três banhos por dia.
Olhamos para o “Milímetro” e notamos que estava com umas olheiras, então alguém ficou encarregado de informá-lo, que aquilo que ele andava fazendo era pecado..... de confissão.
O MICROFONE ABERTO
O mês de agosto e o início do mês de setembro eram marcados pelo som dos tambores e o som metálico das cornetas e clarins, das fanfarras ensaiando para o desfile do dia sete de setembro.
A cidade era despertada por esses sons, para uma onda de patriotismo e nós estudantes, naquela época, éramos tomados por um sentimento maior, de amor a pátria, e nos preparávamos para homenageá-la através do desfile cívico que ocorria no dia sete de setembro, na Rua Hercílio Luz, que ficava tomada de pela população, e dessa forma também a homenageavam.
Os preparativos começavam nas casas, as mães preocupadas com os uniformes, as blusas brancas de “doer os olhos”, para nós alunos do Colégio Salesiano, o tradicional uniforme, blusão branco com o escudo do colégio sobre o peito, calças brancas, meias pretas e sapatos colegiais também pretos “engraxadissimos”. As meninas do Colégio São José, do Grupo Escolar Victor Meirelles e de outras escolas públicas que desfilavam, com suas blusas de fustão branco de mangas compridas acompanhadas de pequena gravata azul marinho, saias plissadas meias três quarto, brancas e os sapatos colegiais pretos. Predominava o azul e o branco, para os uniformes muito pouco ou quase nada de adereços ou fantasias.
Nos colégios e escolas os preparativos, os ensaios das fanfarras, os ensaios de marcha, os pelotões, as bandeias os mastros e florões, as bicicletas que abriam o desfile, enfeitadas com as Bandeiras Nacional, do Estado e do Vaticano e muito papel crepom verde e amarelo nas rodas. Os instrumentos da fanfarra muito lustrados, as caixas e taróis com cordas novas, os surdos de couros novos, todos decorados com flâmulas verde-amarelas ou azuis e brancas.
Nas aulas de Canto Orfeônico, os ensaios dos hinos, Nacional, da Bandeira e o da Independência.... “ou ficar a pátria livre /ou morrer pelo Brasil”, será que alguém ainda lembra..... ou sabe que temos um Hino da Independência.
Os avisos as comunicações: os cuidados com o uniforme, a pontualidade, a disciplina, o garbo e o patriotismo.... o alinhamento, o passo certo e a conscientização de que naquele momento estávamos representando o nosso Colégio.
No dia sete de setembro, às cinco horas trinta minutos, partíamos do pátio do Colégio Salesiano e através da Rua Gil Stein Ferreira, nos dirigíamos para frente da Prefeitura Municipal, que estava instalada no Palácio Marcos Konder, na Rua Hercílio Luz, onde às seis horas saudávamos o dia tocando a alvorada. Daí desfilando pela nossa principal rua, aos sons dos tambores e cornetas voltávamos para o colégio com o dia já clareando para a o desfile com todos os alunos.
Às oito horas, o pátio do colégio se enchia, todos impecavelmente uniformizados, cabelos cortados e penteados, alguns até endurecidos de tanto “gumex” ou espuma de sabonete. Daí partíamos para a concentração, no largo da Igreja Nova (hoje Igreja Matriz), para na hora marcada, adentrarmos a Rua Hercílio Luz e com garbo e disciplina, e orgulhosos de estarmos homenageando nossa pátria, passando na frente do palanque das autoridades, armado ao lado do Banco Inco. Sempre marchando, e sob os aplausos dos expectadores retornávamos ao pátio do colégio pela Rua Lauro Muller e Rua Gil Stein Ferreira.
Naquele ano tudo dera certo, nem uma falha um desfile perfeito, já dentro do pátio já pensávamos no sanduíche de mortadela e na laranjinha que eram distribuídos após os eventos... a fanfarra parou...só os passos da marcha no chão do pátio....alto...todos permaneciam em posição de sentido, até que o corneteiro-mor deu o toque de descansar.
A porta da secretaria estava lotada, os atrasados, e os “pés de bicho” (aqueles que não desfilavam por alegarem estar com algum problema), o Padre Pedro Baron sai do meio deles e sobe no banquinho tradicional, empunhando o microfone que tinha um cabo comprido que ia até a sua sala, para nos falar como era de praxe:
- Vocês estão de parabéns... Elogios.... Elogios, e para terminar vamos escutar a “marcha batida”
O corneteiro-mor deu o toque de sentido, e iniciou a marcha batida, que foi quebrada pelo som do alto-falante:
- Bi... Bip! ...Bi... Bip!... Sai da frente pé de bicho!
Era o Emilio... Ele havia chegado atrasado e auxiliava Padre Baron levando o microfone de volta até a secretaria.
O COROINHA BEBUM
Nos nossos tempos de Colégio Salesiano existiam duas “pequenas
congregações” a Companhia de São Luiz Gonzaga, e a Companhia do Pequeno Clero.
A Companhia de São Luiz, com suas atribuições de promover ações de apostolado
entre os jovens, inspiradas no padroeiro da juventude São Luiz Gonzaga sempre
apresentado como modelo a ser seguido no contexto salesiano.
A companhia do Pequeno Clero, com suas atribuições de ajudar na
sacristia e nas celebrações religiosas era formada pelos coroinhas que tinham
como patrono São Tarcísio.
A origem da palavra coroinha não é bem certa. Existem duas versões, a
primeira que vem do latim “pueri chori” que significa “menino do coro”, os
meninos que cantavam no coral durante a celebração da missa, às vezes eram chamados
para auxiliar os padres no serviço do altar. Os “meninos do coro” eram chamados
de coroinhas. A segunda versão vem da tonsura, os jovens seminaristas ao
receber as ordens menores, eles recebiam a tonsura, uma espécie de coroa que
era feita na cabeça e marcava a iniciação da vida clerical. Os que ajudavam no
altar, devido à coroa que possuíam na cabeça ficaram conhecidos como coroinhas.
O Pequeno Clero como chamávamos, se reunia geralmente aos sábados para
montar a escala dos ajudantes das missas do domingo, onde os padres do colégio
iriam celebrar: os que iriam ajudar a missa na “Matriz Velha”, a Igrejinha da
Imaculada Conceição, e os que ajudariam a missa das oito horas no Colégio
Salesiano.
Havia duas categorias de coroinhas; “os tochas” e “os acólitos” (acho
que isso era uma nossa de classificar), a principal diferença que existia entre
os coroinhas e os tochas eram as funções e responsabilidades, os tochas era
mais próprio dos pequenos, eram os iniciantes, ainda não sabiam “responder a
missa” em latim, não conheciam todos os cerimoniais. Vestiam batinas vermelhas
e sua função era de postarem as “tochas acesas” na hora da celebração
eucarística.
Os acólitos já tinham certo grau de maturidade e entendimento, a
principal função do acólito era assistir ao sacerdote no serviço do altar. Para
ser acólito, era necessário “responder a missa em latim” conhecer o cerimonial,
estes podiam vestir as batinas pretas.
Às vezes éramos encarregados de fazer alguns serviços de sacristia, como
preparar os paramentos para a missa, prover de óleo a lâmpada do santíssimo,
prover da água e vinho as galhetas e outros pequenos serviços, isto tudo
supervisionado por um Clérigo.
Numa manhã, de um dia comum, fomos convidados para ajudar uma missa, que
seria celebrada por um padre visitante, era uma missa que não tinha público,
era só sacerdote e os ajudantes, que seria realizada às 11 horas, na capela. No
recreio, combinamos com os outros que iriam ajudar a tal missa que no horário
marcado, sairíamos da aula e nos encontraríamos na capela. Como os clérigos
estavam dando aula, e não poderiam se ausentar escalamos aquele que tinha mais
disponibilidade para chegar antes na sacristia e deixar tudo preparado para a
celebração. A sacristia da antiga capela do colégio, era muito pequena, como
embaixo do altar havia um bom espaço, ai eram guardados alguns materiais e
objetos que eram usados nas celebrações, principalmente o vinho.
O escalado deveria chegar 15 minutos antes que era tempo suficiente para
preparar tudo para a missa, mas depois ficamos sabendo que terminado o recreio
às 10 horas, ele tinha ido direto para a capela.
Chegamos para a missa e não encontramos o escalado, que deveria ficar na
sacristia durante a celebração, dando apoio ao que fosse preciso, pensamos que
ele tinha ido ao banheiro, e como o celebrante já estava lá devidamente
paramentado e tudo pronto, começamos a missa.
Depois da consagração, ouvimos um som que vinha de debaixo do altar de
alguém dormindo e roncando, olhamos um para o outro, e começamos a cantar para
abafar o som, para espanto do celebrante, que nos olhou um pouco sorriu deu a
benção final e encerrou a missa. Esperamos o celebrante deixar a capela e
corremos para baixo do altar, para ver o que já desconfiávamos o escalado
estava dormindo sentado, abraçado com uma garrafa de vinho, totalmente bêbado.
O RETIRO ESPIRITUAL
Todo ano era a mesma coisa, assim que começava ao esquentar o tempo,
final de setembro começo de outubro, era marcado o retiro espiritual. Acho que
a intenção de marcar para essa época era proposital, visto que a maioria dos
alunos chegando à puberdade, e com a aproximação da primavera, os hormônios
gonadotróficos entravam em ebulição. Antes que se tornassem discípulos de Onã
(livro do Genesis capítulo 38), e passarem a praticar o Onanismo, era
necessário que se colocassem mecanismos de repressão já que o ato da
masturbação era condenável pela Igreja, embora não seja nenhuma doença e nem
cause doenças. Destes mecanismos era o pecado e o temor de ir para o inferno e
estes eram os temas mais recorrentes durante as pregações do retiro espiritual.
As aulas eram suspensas, por três dias, a presença era obrigatória, nem
o Gilberto que era dispensado das missas, pois era da Assembléia de Deus (da “leléia”,
como diziam) podia faltar, afinal não era só pregação religiosa, mas também
tinha conteúdos de formação.
Acho que também teve o lado positivo, pois como sugere o nome eram
alguns dias que nos retirávamos das ocupações cotidianas, das distrações e
barulhos do mundo para nos ocuparmos com a reflexão sobre nossas jovens vidas.
Cada turno vinha no seu turno, no nosso turno o matutino, o primeiro dia
começava com a missa seguida de uma pregação, feita por um padre vindo de outro
colégio, Como a comunhão neste dia era opcional, no intervalo a cantina
(“barzinho” como nós chamávamos) não abria, pois a jejum era uma forma de
expiação dos nossos pecados. Nos recreios pouco barulho, conversa baixa, nada
de ping-pong ou bola de espiribol, nada podia quebrar a concentração.
A manhã continuava com mais palestra, até o meio dia, quando éramos
dispensados, mas com recomendações de que estávamos em retiro e que em casa
deveríamos adotar procedimentos mais comedidos dos que os usuais dos “dias
comuns”.
No segundo dia, começava com as orações da manhã, todas impressas na
caderneta escolar, com partes em português e partes em Latim, todos os Atos, de
Fé, de Esperança, de Caridade, de Contrição, Oração a São Domingos Sávio, Dom
Bosco, Nossa Senhora Auxiliadora, pelos ex-alunos e pela Pátria, era oração que
não acabava mais. Após todas as orações, mais pregação, com intervalo sem
ping-pong, sem espiribol, pouco barulho.... e na volta.....mais pregação e antes
de terminar, a Missa que acabava com Benção do Santíssimo Sacramento...e antes
de ir para casa mais recomendações etc...etc...etc...
O último dia era o dia da contrição, começava com as orações depois
pregação, ai vinha o intervalo, onde todos formavam duas filas, e caminhávamos
em volta do pátio, em silencio, era preparando-se para a confissão, que ocorria
durante este ritual, cuja fórmula tinha sido feita na prédica daquela manhã.
A parte final daquele ultimo dia era terrível, depois da missa vinha a
oração mais macabra e terrível que já conheci, o “Exercício da Boa Morte”, que
era constituída de duas partes, a primeira oração para impetrar a graça de não
morrer improvisamente, como se a morte mandasse avisar, toda iniciada por
superlativos absolutos sintéticos eruditos, como Mericordiosissimo,
Benignissimo, Amabilissimo....e a segunda parte a Oração para a boa morte a N.
S. Jesus Cristo, que era uma narrativa da última hora, fase por fase, do
indivíduo quase cadáver ....” Ó
misericordioso Jesus”....
PERGUNTA PRO GALO
Nos nossos tempos de
Ginásio Salesiano, sexo era algo inadmissível, qualquer alusão ao ato ou ao
fato era de corar o vivente. A vigilância era constante, os clérigos que
acompanhavam os recreios e as recreações, ficavam de olho bem aberto. Qualquer
movimento suspeito era averiguado e se confirmado o aluno ia direto para o Pe.
Conselheiro e os pais eram chamados para uma conversa, cujo teor nunca
ficávamos sabendo.
Alguns clérigos eram
mais liberais, ou seja, fechavam um olho, mas tinha os que levavam as coisas a
ferro e fogo, estes coitados eram os alvos de algumas brincadeiras
provocativas.
Mas que se faça
justiça eles juntos com os padres e professores foram os grandes responsáveis
pela nossa formação até por serem os que tínhamos maior contato, alguns se tornavam amigos no mesmo grau de um colega de
aula. A educação da época permitia, pois sabíamos diferenciar o amigo professor
do professor amigo.
No início dos anos
60, com o Ginásio já encaminhado, os salesianos colocaram em prática a segunda
parte do seu projeto para Itajaí, começar uma obra social, um “oratório festivo” nome dado pelos salesianos ao lugar onde
o jovem poderia se sentir acolhido, com harmonia, confiança, cordialidade e
amor.
O local que os
salesianos de Itajaí escolheram para iniciar sua obra social era a região mais
pobre de Itajaí na época, e onde os jovens corriam o maior risco de se
marginalizarem, o bairro do Matadouro.
O trabalho começou
primeiro na capelinha do bairro, em 1961. Em um terreno concedido pelo governo
do estado, foi fundado o “Oratório Festivo Salesiano”, que na época consistia
em um lugar de recreação infanto-juvenil
com finalidade evangelizadora. Graças a dedicação e ao trabalho do incansável
irmão salesiano Aquilino Minella, e a participação da comunidade em 1963
deram-se início as ações de caráter social, com cursos de corte e costura, de
barbearia e instalação do serviço ambulatorial e farmácia e o oratório se
transformava em “Parque Dom Bosco”.
Nós alunos do Ginásio
Salesiano éramos motivados a participar, com doações de roupas usadas,
brinquedos, alimentos para serem distribuídos entre as pessoas carentes da
comunidade. Muitas vezes íamos de bicicleta até o “final da Rua Brusque” como chamava
o local na época para ajudar nos esportes e como coroinhas nas missas que lá se
realizavam.
Foi criada uma festa
junina no feriado de 29 de junho, dia de São Pedro e São Paulo, para angariar
fundos para a obra. Primeiro funcionando no pátio do Ginásio, no centro da
cidade de mais fácil acesso, mesmo porque no local as condições eram bem
precárias e as pessoas tinham medo de freqüentar o bairro numa atividade
noturna.
Quando ocorria a
festa, era pedido aos alunos a doação
prendas, para o funcionamento das “barraquinhas”, para as rifas enfim
para as atividades típicas de uma festa dessa natureza.
Num dia marcado para
levar as doações um clérigo que estava no colégio na época ficou encarregado de
receber as doações, que os alunos trariam no início das aulas.
O clérigo curioso ao receber
a doação, muito bem embrulhada, de um aluno que não era muito a favor do que
estava fazendo, querendo agradá-lo pergunta:
-
O
que temos aqui, neste embrulho tão bem feito?
-
Uma
galinha assada, responde o mal-humorado.
-
E
ela está gostosa? Insistiu o Clérigo
-
E
eu vou saber? Pergunta pro galo...
O agradecimento da
doação foi feito pelo Padre Conselheiro para onde o aluno “devasso” foi mandado.
AS POMBAS
Cursávamos a terceira
série do Curso Ginasial (hoje Ensino Fundamental), lá pelos idos de 1962, no
Ginásio Salesiano Itajaí. A maioria da nossa turma tinha entre 13 e 14 anos. No
segundo semestre daquele ano letivo, nosso professor de Português anunciou que
haveríamos de ter aulas de oratória.
Oratória, a arte de
falar em público de forma estruturada e deliberada. O orador pode utilizar todo
o seu potencial para informar, influenciar, convencer, ou entreter os ouvintes.
Mas a oratória tem um conjunto de regras e técnicas adequadas para produzir e
apresentar um discurso. E nela são muito importantes as qualidades pessoais do
orador. Assim nos foi posto pelo padre professor. A sua tarefa era árdua, fazer
aquela turma de garotos, tímidos, inibidos cheios de medos, vergonhas e tabus,
a falarem para o público.
Tinha que corrigir
primeiro a postura, uns de mãos no bolso, outros com os braços nas costas ou
cruzados, o posicionamento das pernas não se apoiar ora sobre uma ora sobre
outra, olhando para o chão e ainda aqueles que por nervosismo gesticulavam como
se estivessem querendo voar, de forma excessiva.
Para treinar resolveu
que deveríamos decorar alguns sonetos e declamá-los em sala de aula, levando em
conta as circunstâncias do ambiente, recomendando que não devesse rir ou causar
qualquer constrangimento aos colegas mais inibidos, mas sim ajudá-los isso era
um ato de caridade.
O primeiro soneto
escolhido foi “Mal Secreto” de Raimundo Correa... Um poema vibrante ótimo para
o ensaio da fisionomia, da voz, do gesto, da mensagem.
Dava gosto de ver o
nosso colega o Ricardo, apresentava-se
de maneira elegante, sem humildade nem arrogância, olhava para todos os lados,
com uma fisionomia coerente com a mensagem do poema:
-
“Se
a cólera que espuma, a dor que mora n’alma, e destrói”.. e terminava
vibrante...
-
“Quanta
gente que ri, talvez existe, cuja única ventura consiste, em parecer aos outros
venturosa!”
Aplausos da turma
toda, o Ricardo já nascera um orador, com certeza ele seria o orador da nossa
formatura no ano seguinte.
Veio o segundo soneto
e resolvemos que seria do mesmo autor, escolhemos um que falasse de sonhos da
adolescência... “As pombas”.
Após o prazo para
decorar e preparar a apresentação vieram as aulas de apresentação, e numa delas
o professor chamou o Moa para fazer a sua declamação ( vou omitir seu nome e o
seu apelido). Na frente de toda a classe vermelho qual uma pimenta, trêmulo ele
começou a sua interpretação:
-
Vai-se
a primeira .... despertada... Vai-se outra mais ... mais outra...enfim dezenas
de ...vão-se ...apenas raia sanguínea e fresca madrugada...
O professor interrompe
a apresentação e questiona-o:
-
Seu
Moa, o senhor pulou alguns trechos do poema, talvez não o tenha decorado
direito?
-
Seu
Padre desculpa, mas eu prometi para a minha mãe que nunca mais na minha vida eu
falava esse palavrão ainda mais em público.
O Moa confundiu as
pombas do soneto do Raimundo Correa com outra coisa... quando nós apontávamos para ele aquelas pombinhas
que viviam ali pelos correios ele ficava vermelho e respondia com um pesado
palavrão.
AS GEOGRAFIAS
No final dos anos 50,
início dos anos 60, a Geografia como disciplina escolar era extremamente
vinculada a conceitos definitivos. Os livros forneciam informações meramente
descritivas que não faziam nenhuma ligação entre os aspectos naturais e
sociais. A preocupação era somente conhecer, ou melhor, “decorar” acidentes
geográficos, nomes de rios, de países e suas capitais, dados estatísticos,
entre outros. Daí, constatamos que os conteúdos adotados não tinham
perspectivas críticas e sim técnicas e sem argumentação.
A Geografia
valorizava os aspectos físicos enquanto que
a dinâmica populacional e os fatores históricos eram quase desprezados.
Além disso, existia uma nítida distinção entre a Geografia Humana e a Geografia
Física.
Era desta forma que
aprendíamos a Geografia nos tempos de Ginásio Salesiano Itajaí, para onde íamos
para as aulas, munidos dos livros de Geografia Geral, Geografia do Brasil, de
autoria do Aroldo de Azevedo e do belo Atlas, de capa azul “Atlas Geográfico
Melhoramentos” de autoria de Geraldo José Pauwels.
No quarto primário,
no Admissão ao Ginásio e na 1ª série do ginasial o nosso professor de Geografia
foi o Padre Otávio, cuja característica física que mais se destacava era a sua
careca, muitos cabelos ao derredor da cabeça e ao centro como uma grande
tonsura nenhum fio. Munido de uma baquetinha de tambor para apontar no quadro e
bater na carteira para chamar-nos à atenção, sabatinava-nos oralmente:
-
Número
37, (chamava-nos pelo número), O que é Ilha?
-
É
um pedaço de terra cercado de águas por todos os lados. (respondia o 37).
-
Número
22, O que é arquipélago?
-
É
um conjunto de ilhas.
-
Número
15, O que é atol?
-
Atol
...Atol ...não sei a definição seu padre, mas sei um exemplo.
-
Então
dia.
-
A
sua “careca”, uma ilha cercada de palmeiras por todos os lados.
A baquetinha de
tambor partiu ma mão do padre como um raio acertando de raspão a orelha direita
do Jacaré que nem esperou ser mandado, já foi saindo da sala de aula indo se
apresentar ao Padre Conselheiro.
O Pe. Otávio foi
embora e em seu lugar veio o padre Zeno que além de Geografia dava aulas de
Português. Suas explicações eram conhecidas pelos exageros, como “ um canguru
australiano pula mais alto do que uma casa de dois andares” ou, “se chover
durante um ano todo Itajaí alaga somente 30 cm” e outras.
Na terceira série do
ginasial o assunto era “Regiões Brasileiras” não haveriam provas mas seriam
entregues trabalhos de pesquisas, com muitos mapas e ilustrações sobre os
estados e suas regiões. Nas aulas após as explicações questionava a classe com
perguntas sobre as regiões para testar nosso aprendizado, o aluno levantava a
mão e o nome do estado e a sua riqueza:
-
Pernambuco,
cana de açúcar.
-
São
Paulo, café.
-
Bahia,
cacau.
Foi ai que o Trinta e
oito levantou a mão e o Pe. Zeno o encorajou:
-
Diga
menino!
-
Navegantes,
caju lá tem muitos “pés”.
Além de ir para fora
da sala de aula e se apresentar ao Padre Conselheiro, o Trinta e oito ainda
levou uns bons tabefes... e nada de contar em casa senão a surra seria maior.
UM GINÁSIO PARA ITAJAÍ
Aos meninos de
Itajaí, que concluíam a escolarização formal, no Grupo Escolar Victor
Meirelles, nada mais restava senão arrumar um emprego e seguir uma profissão das
então oferecidas naqueles anos de 1930. Era necessário então que a cidade
oferecesse uma continuidade da educação formal, e para isso um ginásio passou a
ser uma exigência da população itajaiense. Poucas cidades, além de
Florianópolis possuíam o curso secundário, obrigando os jovens a se
transferirem para outras cidades ou para centros maiores para complementarem
seus estudos. Isso só era possível para os de famílias mais abastadas, já que a
manutenção dos filhos, fora do lar, era caro e complicado para a época.
Em abril de 1936,
assume a prefeitura de Itajaí o Sr Irineu Bornhausen que no mesmo ano assinou
uma Resolução criando o Ginásio Itajaí e iniciando as obras físicas onde
deveria funcionar o tão aspirado curso secundário. Mas a gestão do prefeito foi
pontilhada de uma série de dificuldades ocasionadas pelo golpe do Estado Novo
(1937) que culminou com sua renuncia em janeiro de 1939. Além dessas
dificuldades e o início da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) atrapalharam a
implantação e a construção do ginásio, que nesta data já estava com as paredes
levantadas e prontas para “receber a cumeeira”.
Quando nosso país
entrou na Segunda Guerra Mundial, a proximidade do mar trouxe para Itajaí uma
companhia militar, um contingente do Batalhão de Construtores oriundo do Paraná
alojando-se no ginásio em construção, concluindo as obras em caráter
emergencial, e ali permanecendo por um período de alguns anos.
Somente em 1947 o
edifício deixa de ser quartel e volta para a comunidade, para ser destinado ao
que se propunha inicialmente. A construção apresentava-se bastante danificada e
deveria ser toda reformada. Para angariar fundos para as despesas de reforma,
acabamento e compra de equipamentos escolares, foi fundada a sociedade anônima
“Ginásio Itajaí S.A.”.
O empreendimento
passava para a iniciativa privada, e o grande itajaiense Genésio de Miranda
Lins, diretor do Banco Inco, liderava o grupo de benfeitores que contava ainda
com Antonio Ramos, Nestor Schiefler e Professor Antônio de Souza Cunha.
A busca de recursos
levou o grupo liderado por Genésio Lins ao Governo Estadual na época ocupado
pelo Interventor Federal, Nereu Ramos. Mas suas esperanças de ajuda foram
negadas com a resposta do Interventor: “a mocidade itajaiense não necessita de
um Ginásio, mas sim de uma Escola Industrial” e que o governo daria amplo apoio
moral e financeiro a uma Escola Industrial.
Porém a negativa não
esmoreceu o animo de Genésio Linz, a sociedade criada, Ginásio Itajaí S.A.,
passou a ser a mantenedora e desta forma criava-se o Ginásio Itajaí.
Fundado o novo
educandário era necessário encontrar alguém que pudesse organizá-lo e
dirigi-lo. Para tanto foi convidado o professor Moacir Társia Morisco,
paranaense radicado em Curitiba que aceitou o convite e mudou-se para Itajaí e
junto com o professor Ary Mascarenhas Passos, trataram da elaboração do
processo de criação e instalação do Ginásio Itajaí.
Na segunda quinzena
de março do ano de 1948, foram iniciadas as atividades do educandário no prédio
reformado na esquina da Rua Felipe Schmidt com a Rua Gil Stein Ferreira. Muitos
foram os entusiastas desta idéia “UM GINÁSIO PARA ITAJAÍ’, seria temeroso citar
todos os nomes, pois poderia cometer o erro de excluir alguém, mas o grande
arquiteto de todo o processo foi os Sr. Genésio de Miranda Lins, a que devemos
esta conquista.
FUZILEIROS NAVAIS
Era o ano de 1963, e
nós estávamos na quarta série do curso ginasial do Ginásio Salesiano Itajaí,
era nosso último ano no estabelecimento, pois naquela época ainda não havia o
curso Científico ou equivalente naquele estabelecimento de ensino.
Quando lembrávamos
que no final daquele ano tínhamos que deixar o Salesiano para ir estudar em
outro colégio, o nosso coração sentia o aperto da saudade, dos colegas dos
quais iríamos nos separar, pois cada um tinha que procurar
seu rumo, e daquele estabelecimento que tanto amávamos.
No segundo semestre,
ao voltarmos das “férias de julho”, fomos contemplados com duas novas salas de
aula, já no “prédio novo”. O nosso Diretor o Padre Pedro Baron, achava que as
duas turmas da quarta série ginasial, por participarem de todas as etapas da
construção do novo edifício deveriam ter o “gostinho” de pelo menos num
semestre estudar naquele prédio que viram ser erguido desde o início do ano de
1960. Durante aqueles anos que participamos da nova construção, foram muitas
rifas, muitos bingos, muitas quermesses e campanhas para arrecadar fundos para
o empreendimento. Além de muita compreensão
com o barulho e muitos cuidados com os perigos da nova obra que dividia
o nosso pátio de recreio o nosso campo de futebol.
Lá estávamos nós em
duas novas e amplas salas de aula, no segundo piso do prédio, cada um com seus
janelões que se abriam para a Rua Felipe
Schmidt por onde recebíamos o sol da manhã e podíamos ver o céu azul mesmo
sentados em nossas novas carteiras escolares.
Neste ano também havia
mudado o critério de aprovação, ou seja, quem conseguisse obter média sete
durante o ano letivo, nas disciplinas, estava aprovado sem fazer exames, e eu havia
firmado o propósito de naquele ano me livrar dos terríveis exames finais. Lá
pelo mês de outubro eu já tinha fechado minha média em Ciências, minha matéria
preferida junto com a Matemática. E foi numa das aulas de Ciências do saudoso
Padre Nestor Junkes, que tivemos nossa atenção quebrada pelo barulho de um avião de caça da FAB, que
fazia manobras no horizonte e podiam ser vistas através da ampla janela da sala de aula.
Olhei para o meu
colega vizinho de classe e como se nos entendêssemos pelo olhar, introduzimos
uma régua na lombada ou cabeceado do livro, formando como se fosse uma
metralhadora, e, numa atitude infantil metralhamos o avião, interrompendo a
aula. Tínhamos na maioria entre quatorze e quinze anos, queríamos ser adultos,
mas muito de criança ainda havia dentro de nós.
Era a última aula daquele dia, o professor o Pe. Nestor,
“vermelho como uma pimenta”, apontando para nós exclamou;
-
Fuzileiros
navais venham aqui e separem as suas cadernetas.
As cadernetas
escolares que ficavam retidas, na secretaria, durante o período de aulas já
estavam sobre a mesa para serem distribuídas, pois a aula estava quase no
final.
Na minha cabeça
passava como se fosse um filme todo o esforço que eu tinha feito para não
receber nenhuma anotação, para passar direto e no dia da formatura receber as
medalhas de aplicação, assiduidade e de comportamento. Tudo perdido por aquela
brincadeira impensada, irresponsável, coisa de “criança”. Além é claro de ter que justificar em casa
aquele lambança que havia feito.
O Pe. Nestor colocou
nossas cadernetas no bolso da batina, e no final da aula mandou-nos esperar no
pátio. Nem falávamos um com o outro, apenas seguíamos com o olhar o Padre que
pacientemente lia o seu breviário indo e vindo no corredor das colunatas do
antigo prédio.
Lá pelo meio dia e meia ele chamou o meu colega que morava em
Navegantes, entregou a caderneta dele e dispensou-o, deixando-me mais
preocupado, pois continuava com minha caderneta retida. Quase uma hora da
tarde, quando a turma que estudava no período vespertino já ia chegando ao
colégio, ele me dispensou, abri a caderneta numa sofreguidão só e ela estava
intacta, nenhuma anotação nenhum castigo. Vibrei como se tivesse marcado o gol
que decidisse o campeonato.
Agora era só arrumar
uma desculpa para dar em casa pelo atraso... Nada como um furo no pneu da
bicicleta não justificasse...
A FILA DO TIO CONSA
Ingressávamos no
Ginásio Salesiano Itajaí, no “quarto primário”, como era chamada a quarta série
do ensino fundamental naquela época, e lá ficávamos até a conclusão da quarta
série ginasial. Uns após o “quarto primário” faziam o “exame de admissão” e se
habilitavam a frequentar o “curso ginasial”, outros que não logravam êxito
neste exame, tinham que frequentar a quinta série antes de ingressarem no curso
ginasial.
Vínhamos do primário
onde tínhamos uma única professora, no Salesiano passávamos a ter um professor
para cada disciplina; Instrução Religiosa, Português, Aritmética, História do
Brasil, e Geografia do Brasil. No início era confuso para aqueles meninos de
dez anos, mas em compensação era uma sensação de que já não éramos mais
crianças, afinal estávamos no Salesiano.
Durante o nosso
período de estudos no ginasial, de 1958 a 1963, passamos por várias formas de
avaliação. Nos dois primeiros anos do ginasial recebíamos as médias das
atividades nos meses de abril e maio, no mês de junho eram feitas as primeiras
provas parciais, uma espécie de exame com o conteúdo de tudo que tínhamos
aprendido no semestre. Isso fechava o primeiro semestre. No segundo semestre as
médias eram dos meses de agosto, setembro e outubro. No mês de novembro os
exames finais escrito para todos e oral para aqueles que não completavam a
média necessária para aprovação. Era um “Deus nos acuda” aqueles finais de ano.
A fórmula para aprovação estava escrita no
“boletim da vida escolar” que vinha anexo nas páginas centrais da caderneta
escolar. “Será considerado aprovado o aluno que obtiver, no mínimo, média
QUATRO em cada matéria e média CINCO no conjunto das matérias”.
Aqueles que não
conseguiam aprovação em duas matérias tinham a chance de uma segunda época (um
novo exame final) realizada no mês de fevereiro do ano seguinte, os que
reprovavam em três e mais matérias tinham que repetir a série novamente.
Isso era uma
humilhação, ver os colegas irem adiante e ter que repetir a mesma série, mas
este era o critério e assim era feito então. Em 1962 mudou toda a forma de
avaliação. Os exames orais foram abolidos e passamos a ter sete notas e o exame
final, para o aluno ser aprovado à média
final ( media mensal multiplicada por sete e a nota do exame final multiplicada
por três divididas por dez) deveria se igual ou maior que cinco. Constava ainda
no “boletim da vida escolar” uma nota mensal de “Aplicação” de zero a dez e outra de “Comportamento” que variava de dez
a quatro ( dez = ótimo com louvor; nove = ótimo; oito = muito bom; sete = bom;
seis = deficiente; cinco = sofrível; quatro = mau. Abaixo disso já tinha sido
expulso há muito tempo.
A assiduidade tinha
um controle rígido, “todos os dias” ao entrar no ginásio apresentávamos nossa
caderneta com o carimbo de “Presente” do dia anterior ou de “Missa” se fosse à
segunda feira. Sem isso, não entrava no colégio, a menos que viesse a falta
justificada pelo responsável. Enquanto permanecíamos no colégio da “Caderneta
Escolar” ficava retida na secretaria para os controles, e era entregue pelo
professor da última aula, quando ela não vinha era por que alguma
irregularidade tinha sido cometida... Ai amigo a coisa ficava grave, tínhamos
que ir buscá-la no gabinete do Padre Conselheiro o “Tio Consa”, que além de uma
reprimenda nos brindava com uma “anotação”, comunicando aos pais da falta
cometida, e o ajuste em casa era duro. Não dava para esconder, pois no dia
seguinte para entrar nas aulas a “maldita anotação” tinha que estar assinada
pelo responsável. Nada escapava desde uma simples “ não corrigiu a tarefa de
Latim” até as pesadas quando se tratava de algum descumprimento das normas
disciplinares, que não eram poucas. Ficar na fila do “Tio Consa” era um martírio,
a turma toda ia embora e o premiado esperando pelo pior.
Naquela fila, a fome
passava, a cor do indivíduo mudava para um branco acinzentado, os rostos
fechados, o cérebro em plena atividade em busca de um o que eu vou falar em casa...não era mole ir para a fila do “
Tio Consa”.
UMA VIAGEM DE TREM
Já no início do ano
letivo, quando fazíamos a primeira reunião da Cia. do Pequeno Clero (Estratégia
educacional criada por Dom Bosco para fomentar o gosto dos jovens pela vida
sacerdotal, os alunos do grupo recebiam instruções do Clérigo Salesiano para
ajudar as missas e outras cerimônias religiosas.), no Ginásio Salesiano Itajaí
para o planejamento das atividades daquele ano, era programada a visita de três
dias ao Seminário São Paulo em Ascurra.
Mas para aquele ano
de 1961, foi-nos dito que a viagem não seria a Ascurra, mas a Rio do Sul, pois
iríamos participar da Concentração de coroinhas de todas as paróquias e escolas
salesianas, da Visitadoria “São Pio X”. Esta nossa viagem não seria como as de
Ascurra que íamos de carro, os pais dos alunos que tinham carros levavam-nos,
mas seria de trem e não ficaríamos alojados no colégio, mas nas casas de outros
amigos coroinhas de Rio do Sul.
No dia marcado,
embarcamos na estação da Fazenda às treze horas, o trem partiu em direção a
Brusque, e a uns dez quilômetros na Estação Engenheiro Vereza fez uma longa curva e mudou de rumo em direção a
Ilhota, Gaspar e Blumenau. Às vezes nos aproximávamos do rio Itajaí-Açu, outras
vezes nos afastávamos, serpenteando nas terras do Vale do Itajaí. As paisagens
do trajeto eram belíssimas, banhados, riachos, roças, montanhas, pequenas
propriedades onde as pessoas deixavam seus afazeres e abanavam para os
passageiros do trem que correspondiam ao cumprimento.
-
Túnel!
Olha o Túnel! Janelas fechadas! Fechem as janelas era a ordem dada pelo
cobrador que passava gritando de vagão em vagão.
As luzes dos vagões
eram acesas, era sinal que iríamos entrar no túnel. Ao entrar na escuridão
viam-se as fagulhas incandescentes passarem rápidas e rentes aos vidros,
Parecia um espetáculo pirotécnico. Se alguém desobedecia à ordem de fechar a
janela podiam chamuscar o rosto e as roupas, além do vagão ficar todo
enfumaçado e os olhos arderem devido aos subprodutos da queima da lenha que
aquecia as caldeiras.
-
Olha
a ponte dos arcos! Chegamos a Blumenau.
Cruzamos sobre o Rio
Itajaí-Açú pela ponte belíssima, Em Blumenau a parada era mais longa. Vagões
eram substituídos por outros. Eram os vagões de carga que vinham do porto de
Itajaí carregados de produtos importados.
Partimos de Blumenau.
Para continuar a viagem tinha que tomar a outra margem do rio e isso era feito
pela ponte de ferro. Era algo especial, era uma sensação diferente, o barulho
era mais intenso e contínuo. Não era aquele entrecortado como no leito normal.
Os ferros das laterais “passavam” rapidamente. Lá embaixo a beleza do nosso
rio.
De tempos em tempos,
o comboio parava para abastecer a locomotiva de água ou de lenha, Antes de
chegar às estações das cidades lá vinha o cobrador gritando:
-
Encano!
– Indaial! – Warnow! – Ascurra! – Apiúna!
Aqueles que tinham
que descer preparavam as suas bagagens. Embarcavam também outros passageiros,
as crianças de olhos arregalados meio assustadas iam tomar os lugares vagos.
Chegamos à estação
Subida. Iríamos subir a serra. Faziam a troca da locomotiva. No momento em que
a locomotiva substituta encostava-se aos vagões para ser engatada, o tranco e o
estrondo eram fortíssimo e sacudia tudo, os passageiros desavisados ficavam assustados.
Mais água, mais lenha
e lentamente íamos subindo a serra. Em determinados momentos parecia que o tem
esta pendurado na encosta. Lá embaixo o rio correndo sobre pedras formava
pequenas cachoeiras. Os postes escuros do telégrafo( a comunicação entre o trem
e as estações era feita por “código Morse”) acompanhavam os trilhos. O cobrador
passava continuamente pedindo os bilhetes para picotá-los e em seguida
devolvia-os. Nas Estações, das plataformas os vendedores ambulantes ofereciam
pelas janelas dos vagões os seus produtos. Insistiam para vender até o momento
que o sino batia avisando a partida. Às vezes acompanhavam correndo ao lado do
trem insistindo na venda.
-
Riachuelo!
Lontras! Matador! Rio do Sul!
Eram quase nove horas
da noite, chegamos ao nosso destino, ainda com a adrenalina a mil, descemos na
estação, lá estava o nosso anfitrião portando um cartaz nos identificando.
É CAMPEÃO
Jamais irei
esquecer-me daquela manhã do domingo, 29 de junho de 1958. Tinha dez anos e
freqüentava a 5º primário no Ginásio Salesiano. Era o início das férias de
julho, mas isso não nos desobrigava de ir à missa no Ginásio, pois ainda era período letivo, e a missa era obrigatória, tinha
que carimbar a caderneta. Porém aquele domingo também era especial, era a data
do jogo final da Copa do Mundo FIFA de 1958, na sexta edição que começara no
dia 10 de junho. O evento era sediado na Suécia. Ela foi disputada por
dezesseis seleções nacionais, doze européias e quatro americanas, o Brasil
disputava vaga com a Áustria, Inglaterra e a URSS. O Brasil estreou bem com 3 a
0 na Áustria. No segundo jogo, foi mal e empatou em 0 a 0 contra a Inglaterra.
Após o empate os jogadores se reuniram com o treinador, Vicente Feola, e
pediram a entrada de Mané Garrincha e Pelé no time. O pedido deu resultado:
Brasil 2 a 0 na URSS, com uma grande atuação de Garrincha entortando seu marcador. A seleção deslanchou, eliminou a
seleção de País de Gales por um a zero, com um golaço de Pelé, e arrasou a França do artilheiro Just Fontaine
por cinco a dois.
Chegamos à final
contra a Suécia, dona da casa. No Estádio Rasunda em frente a um público de
50.000 espectadores em uma partida excepcional.
Mesmo com a derrota de 5 a 2 em casa, os torcedores suecos aplaudiram de
pé, ao saudar como campeões do mundo Garrincha, Pelé, Vavá, Zito, Mazzola,
Nilton Santos, Didi, Gilmar, Zagallo, entre outros. A seleção canarinho sagrava-se
pela primeira vez campeã mundial de futebol e decretava o fim do “complexo de
vira latas”
Milhares de
brasileiros se reuniam nas praças das cidades, para ouvir por alguns
alto-falantes a transmissão do jogo pela radio AM.
Nós alunos do
Salesiano, participaríamos das atividades esportivas no pátio e ouviríamos o jogo nos alto-falantes do Ginásio, que
naquele dia ao invés das músicas da Orquestra Cassino de Sevilha, transmitiria
o jogo final entre Brasil e Suécia.
Acompanhar um jogo de
futebol no rádio era emoção certa. Aquele ruído característico da transmissão
da AM ao fundo dos bordões consagrados como “abrem-se as cortinas e começa o
espetáculo”..., “Aguenta coração!”... “Alô, alô Brasil, de Norte ao Sul”, “Uma
beleeeeza de gol” ou “Que golaaaaço” faziam parte da festa e aumentava a
expectativa do torcedor. O locutor da radio era o espetáculo. Ele desenhava
conforme a sua capacidade criativa e o ouvinte imaginava a cena, a paisagem de
acordo com a sua imaginação. È inegável que o futebol pelo rádio é sempre emocionante.
Naquele domingo
inesquecível, quando já vencíamos a seleção Sueca por quatro a um, deixamos o
Salesiano e saímos para ir para casa, em frente as suas residências as pessoas
festejavam, muitas colocaram os rádios nas janelas. Caminhávamos escutando o
jogo. Na Rua Tijucas comemoramos o quinto gol. Quando chegamos à Rua Blumenau escutamos o
locutor gritar... ”Pode soltar o grito povo brasileiro, Brasil campeão mundial
de futebol!”. Em ritmo de samba... o país comemorava ...”o baile começou, Didi
para Pelé! Pelé centrou para Garrincha que sassaricou entregando lá frete pra
Vavá que atirou ... Gol de Vavá! ...a rede balançou. Gilmar, De Sordi, Bellini,
Nilton Santos, Zito e Orlando, Garrincha, Didi, Vavá, Pelé e Zagalo, este é o
escrete nacional, que vencendo a Suécia, com bravura e decisão, conquistou para
o meu Brasil, o cobiçado título de Campeão Mundial!
Algumas dessas historias eu sabia quando frequentei o ginásio(1959/1962),mas nao com todos esses detalhes.
ResponderExcluirSobre as colas nos dias de prova,lembro que o Pe.Antonio(conselheiro) ficava de espreita na porta do fundo da sala do antigo colégio para ver quem colava.Por isso os alunos nomeavam um aluno para avisar quando ele passava.Ele era um Pe.rigoroso.Certa vez deu um ponta-pé em um aluno e expulsou da sala.
Vilso Manoel Soares
Foi empolgante ler sobre a nossa vida do "salesiano" descrita nas minúcias, fizeram que eu fosse retroagindo no tempo e no espaço! Realmente fiquei emocionado e muitas sensações que havia vivenciado no passado - de 1958 a 1961, inclusive, sutilmente saíram de minha mente e não posso negar que surgiram em meus olhos algumas lágrimas sentidas, uma nostalgia, algo indizível, da alma... Meus parabéns, meu forte abraço ao (s) autor (es) que me transportaram muito mais..., desde o primário no Colégio São José (!) - 1954 a 1957 até, como já mencionei ao quarto ano ginasial, em 1961!!! Valeu ! Obrigado..! Hamilton Moreira do Amaral Pereira
ResponderExcluirBoa noite! Teria alguma forma de entrar em contato? Sou aluna do colégio Salesiano e estamos procurando um ex-aluno da década de 60 aproximadamente, pois precisamos de um boletim desta época para apresentar e ganhar uma prova da Ginsal. Caso puder responder ficarei grata, aguardo retorno.
ResponderExcluirObrigada!